Sobras


_O que você está fazendo aqui, no meio da noite?
_Não conseguia dormir.
_São três horas da manhã.
_Três horas era quando você desligava a televisão e, aí sim, eu dormia profundamente. Sem você, não consigo mais.
_Foi você quem me expulsou da sua vida.
_E agora estou te pedindo para voltar.
_Não tem volta. Eu segui adiante.
_Como você seguiu sem mim?
_Exatamente da maneira como você me disse que eu deveria.
_Falei de maneira retórica.
_Mas se aplicou muito bem na prática.
_Sinto saudade de você.
_Você não sente saudade de mim. Você sente saudade de ter alguém sempre à sua disposição.
_Não fale assim.
_Você sabe que é verdade.
_Eu sei que você também me quer de volta.
_Como eu poderia querer de volta algo que nunca tive?
_Como não teve? Passamos anos juntos.
_Você não estava lá. Havia uma sombra ao meu lado. Nada mais que isso.
_Não seja cruel.
_Não estou sendo cruel. E esta conversa não tem sentido. Adeus.
_Espera. Não feche a porta. Será que não sobrou nem um pouco de sentimento seu por mim?
_Eis a palavra-chave. São justamente as sobras que eu não quero mais. Nem as sobras, nem as faltas.

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