Reciclagem


Quem nunca disse que gostaria de passar uma borracha no passado? Como se fosse possível – ou mesmo plausível – apagar tudo que já vivemos. Todos temos esse delírio meio Eternal Sunshine of the Spotless Mind vez ou outra. Parece mais fácil, menos doloroso. Mas seria um grande erro. Mesmo as situações mais cruéis ou traumáticas por que passamos são importantes. Porém, não podemos nos agarrar a elas em definitivo. Tudo tem um prazo de validade.

Por isso que eu, particularmente, prefiro pensar na vida como uma constante reciclagem. Não podemos simplesmente fingir que algo não aconteceu. Mas, é um exercício de coragem separar o que deve ser eliminado e o que deve ser mantido. Aquilo que não nos tem mais serventia, ou até que é tóxico, sim, pode (e deve) ser jogado fora. Já o que ainda pode ser útil, reaproveitado, reformado, remodelado, recolorido, deve ser reutilizado. Não como se o passado fosse um museu, mas, sim, como estruturas de uma obra em andamento.

Gosto de pensar que a cada dia estamos escrevendo nossa história. Ora rascunhando, ora passando a limpo. Ora deixando o coração se expressar livremente, ora corrigindo a ortografia e pondo os pingos nos is. Nada está pronto. A realidade é um quadro inacabado. E pode ser que amanhã já não nos sirva mais algo que parece indispensável hoje. Mas, é importante se desapegar do que já se tornou só um estorvo tomando poeira num canto ou uma página amassada do caderno de rabiscos.

No fim das contas, o essencial é nunca se esquecer a moral da história, a lição aprendida, e utilizá-la para tomar decisões mais sábias no futuro – ao invés de viver repassando o filme todo na memória, revirando detalhes menores ou irrelevantes para o contexto final.

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