Esperou o sono chegar, sem muito sucesso, rolando de um lado para o outro da cama.
Repassou mentalmente as tarefas da semana.
Ensaiou levantar-se para beber água, e foi quando ouviu a fechadura.
Virou-se para o lado e fingiu estar dormindo.
Ele entrou no quarto, silenciosamente, pegou as roupas e foi tomar banho.
Trocou-se no outro quarto.
Ela permaneceu imóvel.
Ele se deitou ao seu lado, a poucos centímetros de distância, mas, para ela, parecia um oceano de distância.
Acabou pegando no sono depois de algumas horas, e teve o cuidado de acordar mais cedo que ele no dia seguinte, como fazia todos os dias.
Evitar o contato era fundamental àquele ponto.
Passou o dia pensando.
Ensaiando seu discurso, revisando seus argumentos – embora não restasse muito mais o que dizer.
À noite, ele chegou tarde outra vez.
Mas ela, ao contrário do que fazia todas as noites, esperou acordada.
Não podia mais postergar aquela conversa.
Não podia mais conviver com aquele abismo.
Não podia mais sentir-se refém do que deveria ser sua redenção.
Saiu de casa na mesma noite, levando apenas uma mala e muita coragem.
E, desta vez, dormiu em paz.