Tem dias em que o tempo parece parar. Estamos confinados em casa, dia e noite, de segunda a sexta, e aos finais de semana também. Não é incomum termos a sensação de desorientação, sem saber que dia da semana é, ou não percebermos que já passou da hora do almoço.
Quase como uma pluma pairando no ar, flutuando ao sabor do vento, sem o menor poder de decisão sobre que direção tomar, ou qual será a hora de pousar.
Ou, como uma pedra, imóvel, inabalável, e tão submissa quanto.
Em tempos de isolamento social, os dias parecem mais longos, e a indefinição potencializa a angústia, a ansiedade e a sensibilidade.
De repente – não mais que de repente – passamos a ter tempo de fazer tudo aquilo que procrastinávamos. Agora temos tempo. Que desculpa inventaremos desta vez? Como e por que deixaremos certas coisas para depois?
Pior que isso é ter tempo para pensar. São você e suas quatro paredes, ininterruptamente encarando umas às outras, confrontando suas verdades e suas meias-verdades.
Nestes dias, tendemos a sentir tudo à flor da pele, a sermos subjugados por nossos sentimentos mais profundos. Ausência, saudade, tristeza, preocupação, tudo elevado à décima potência.
Especificamente para mim, o isolamento forçado (que antes eu praticava só por prazer mesmo) tem aflorado sentimentos e pensamentos há muito aprisionados, emoções que eu estava reprimindo, verdades que eu me negava confrontar.
Agora, está tudo aí, escancarado, feridas reabertas, coração em carne viva, lágrimas rolando, ansiedade atacando, e as listas de afazeres me encarando, cobrando uma atitude.
O processo será longo e acredito que ninguém passará por ele incólume. Que pessoa vai sair depois disso tudo permanece sendo uma incógnita. Mas tenho certeza absoluta de que não será a mesma que entrou.
Enquanto o confinamento prossegue, cruel e pedagógico, prosseguimos, dia a dia; às vezes como a pluma, às vezes como a pedra. Leves e estagnados ao mesmo tempo. À deriva.